Este é o blog das turmas de Teoria do Direito Privado (TDP). Nele são postados comentários sobre as aulas, enviadas opiniões e dicas sobre leitura de material acadêmico e compartilhados documentos.
19 novembro 2013
18 novembro 2013
10 filmes para refletir sobre a situação dos negros no Brasil e fora
Nesta semana da consciência
negra, selecionamos 10 filmes que te farão refletir sobre a situação dos
negros no Brasil e no mundo.
Por Mundo Negro via Instituto Bobbio
Além dos livros, filmes são uma ótima
maneira de saber mais sobre História. Nesta semana da consciência negra,
selecionamos 10 filmes que te farão refletir sobre a situação dos
negros no Brasil e no mundo.
1.Faça a Coisa Certa (Spike Lee – 1989)
Sal (Danny Aiello), um ítalo-americano, é
dono de uma pizzaria em Bedford-Stuyvesant, Brooklyn. Com predominância
de negros e latinos, é uma das áreas mais pobres de Nova York. Ele é um
cara boa praça, que comanda a pizzaria juntamente com Vito (Richard
Edson) e Pino (John Turturro), seus filhos, além de ser ajudado por
Mookie (Spike Lee). Sal decora seu estabelecimento com fotografias de
ídolos ítalo-americanos dos esportes e do cinema, o que desagrada sua
freguesia. No dia mais quente do ano, Buggin’ Out (Giancarlo Esposito), o
ativista local, vai até lá para comer uma fatia de pizza e reclama por
não existirem negros na “Parede da Fama”. Este incidente trivial é o
ponto de partida para um efeito dominó, que não terminará bem.
2. Conduzindo Miss Daisy (Bruce Beresford – 1989)
Atlanta, 1948; Uma rica judia de 72 anos
(Jessica Tandy) joga acidentalmente seu Packard novo em folha no jardim
premiado do seu vizinho. O filho (Dan Aykroyd) dela tenta convencê-la de
que seria o ideal ela ter um motorista, mas ela resiste a esta
idéia. Mesmo assim o filho contrata um afro-americano (Morgan Freeman)
como motorista. Inicialmente ela recusa ser conduzida por este novo
empregado, mas gradativamente ele quebra as barreiras sociais, culturais
e raciais que existem entre eles, crescendo entre os dois uma amizade
que atravessaria duas décadas.
3. A Outra História Americana (Tony Kaye – 1998)
Um dos melhores filmes sobre o tema
racial da década de 1990, não poupa o espectador da violência e do ódio
ao mostrar os crimes de uma gangue racista de skin heads, formada por
integrantes neonazistas, nos Estados Unidos. O filme tem o poder de
mostrar como o ódio racial acaba com a vida tanto de agressores quanto
de agredidos, e é contundente, principalmente pela mensagem e pela ótima
interpretação de Edward Norton.
4. Amistad (Steven Spielberg – 1998)
Baseado em um evento real, este filme
relata a incrível história de um grupo de escravos africanos que se
rebela e se apodera do controle do navio que os transporta e tenta
retornar à sua terra de origem. Quando o navio, La Amistad, é
aprisionado, esses escravos são levados para os Estados Unidos, onde são
acusados de assassinato e são jogados em uma prisão à espera do seu
destino.Uma empolgante batalha se inicia, o que capta o interesse de
toda a nação e confronta os alicerces do sistema judiciário
norte-americano. Entretanto, para os homens e mulheres sendo julgados,
trata-se simplesmente de uma luta pelos diretos básicos de toda a
humanidade: a liberdade.
5. A Negação do Brasil (Joel Zito Araújo – 2001)
O documentário é uma viagem na história
da telenovela no Brasil e particularmente uma análise do papel nelas
atribuído aos atores negros, que sempre representam personagens mais
estereotipados e negativos. Baseado em suas memórias e em fortes
evidências de pesquisas, o diretor aponta as influências das telenovelas
nos processos de identidade étnica dos afro-brasileiros e faz um
manifesto pela incorporação positiva do negro nas imagens televisivas do
país.
6. Quanto Vale Ou É Por Quilo? (Sergio Bianchi – 2005)
Adaptação livre do diretor Sérgio Bianchi
para o conto “Pai contra Mãe”, de Machado de Assis, Quanto Vale ou É
Por Quilo? desenha um painel de duas épocas aparentemente distintas,
mas, no fundo, semelhantes na manutenção de uma perversa dinâmica
sócio-econômica, embalada pela corrupção impune, pela violência e pelas
enormes diferenças sociais. No século XVIII, época da escravidão
explícita, os capitães do mato caçavam negros para vendê-los aos
senhores de terra com um único objetivo: o lucro. Nos dias atuais, o
chamado Terceiro Setor explora a miséria, preenchendo a ausência do
Estado em atividades assistenciais, que na verdade também são fontes de
muito lucro. Com humor afinado e um elenco poucas vezes reunido pelo
cinema nacional, Quanto Vale ou É Por Quilo? mostra que o tempo passa e
nada muda. O Brasil é um país em permanente crise de valores.
7. Agosto Negro (Samm Styles – 2007)
A curta vida do ativista condenado George
Lester Jackson (Gary Dourdan, da série CSI) se torna o estopim para uma
revolução, dando início a mais sangrenta rebelião ocorrida em toda a
história do presídio de San Quentin. Agosto Negro narra a jornada
espiritual e a violenta fé de Jackson, desde sua condenação por roubar
71 dólares de um posto de gasolina até galvanizar a Família Black
Guerrilla com seu incendiário livro, criado a partir de cartas, Soledad
Brother, ou espalhar ferocidade nos corredores de San Quentin em um dia
de agosto, quando seu irmão mais novo, Jonathan, chocou o país ao fazer
refém toda uma corte de justiça na Califórnia, em protesto pelo
julgamento de Jackson. Para o militante George Jackson, a revolução não
era uma escolha, mas uma necessidade.
8. Besouro (João Daniel Tikhomiroff – 2010)
Bahia, década de 20. No interior os
negros continuavam sendo tratados como escravos, apesar da abolição da
escravatura ter ocorrido décadas antes. Entre eles está Manoel (Aílton
Carmo), que quando criança foi apresentado à capoeira pelo Mestre Alípio
(Macalé). O tutor tentou ensiná-lo não apenas os golpes da capoeira,
mas também as virtudes da concentração e da justiça. A escolha pelo nome
Besouro foi devido à identificação que Manuel teve com o inseto, que
segundo suas características não deveria voar. Ao crescer Besouro recebe
a função de defender seu povo, combatendo a opressão e o preconceito
existentes.
9. Bróder (Jeferson De – 2011)
Capão Redondo, bairro de São Paulo. Macu
(Caio Blat), Jaiminho (Jonathan Haagensen) e Pibe (Sílvio Guindane) são
amigos desde a infância e seguiram caminhos distintos ao
crescer. Jaiminho tornou-se jogador de futebol, alcançando a fama. Pibe
vive com Cláudia e tem um filho com ela, precisando trabalhar muito para
pagar as contas de casa. Já Macu entrou para o mundo do crime e está
envolvido com os preparativos de um sequestro. Uma festa surpresa
organizada por dona Sonia (Cássia Kiss), mãe de Macu, faz com que os
três amigos se reencontrem. Em meio à alegria pelo reencontro, a sombra
do mundo do crime ameaça a amizade do trio.
10. Histórias Cruzadas (Tate Taylor – 2012)
Jackson, pequena cidade no estado do
Mississipi, anos 60. Skeeter (Emma Stone) é uma garota da sociedade que
retorna determinada a se tornar escritora. Ela começa a entrevistar as
mulheres negras da cidade, que deixaram suas vidas para trabalhar na
criação dos filhos da elite branca, da qual a própria Skeeter faz
parte. Aibileen Clark (Viola Davis), a emprega da melhor amiga de
Skeeter, é a primeira a conceder uma entrevista, o que desagrada a
sociedade como um todo.Apesar das críticas, Skeeter e Aibileen continuam
trabalhando juntas e, aos poucos, conseguem novas adesões.
Com informações da Biblioteca da Universidade Federal de São Paulo
Fonte: http://norbertobobbio.wordpress.com/2013/11/18/10-filmes-para-refletir-sobre-consciencia-negra/
28 outubro 2013
Resolução CFM n. 2.013/2013 sobre reprodução assistida
Regras garantem direito à reprodução assistida para todos
O Conselho Federal de Medicina (CFM) publica a atualização da resolução que trata dos procedimentos de reprodução assistida no país. A Resolução CFM nº 2.013/13 (acesse a íntegra em PDF) destaca a segurança da saúde da mulher e a defesa dos direitos reprodutivos para todos os indivíduos. A última vez em que a resolução havia sido atualizada foi em 2010, depois de ficar quase 20 anos sem renovação. Para esta revisão, o CFM contou novamente com contribuições dos conselhos regionais de medicina do país e sociedades de especialidades. A resolução preenche uma lacuna importante, pois não existe no Brasil uma legislação que regulamente a prática da reprodução assistida.
A
partir de agora, no Brasil a idade máxima para uma mulher se submeter
às técnicas de reprodução assistida passa a ser 50 anos. O coordenador
da Câmara Técnica de Reprodução Assistida do CFM, José Hiran Gallo,
explica que esta medida levou em consideração a segurança da gestante e
da criança: “pesquisas em todo mundo apontam que a fase reprodutiva da
mulher é de até 48 anos e após essa idade os riscos são evidentes”.
Antes
não havia um limite estabelecido e essa idade foi considerada pelo
risco obstétrico. Segundo o presidente da Sociedade Brasileira de
Reprodução Assistida (SBRA), membro da Câmara Técnica do CFM, Adelino
Amaral, para as mães, após 50 anos, elevam-se casos de hipertensão na
gravidez, diabetes e aumento de partos prematuros. E para a criança, os
problemas mais comum são o nascimento abaixo do peso e o parto
prematuro.
Doação compartilhada -
A Resolução do CFM ainda definiu os termos para a doação compartilhada
de óvulos. Isso ocorre quando uma mulher, em tratamento para engravidar,
doa parte dos seus óvulos para uma mulher mais velha (que não produz
mais óvulos) em troca do custeio de parte do tratamento. Neste caso, a
norma define a idade limite do doador de 35 anos para mulher e 50 para
homem.
A
nova redação também deixa mais claro quanto ao número de oócitos [mesmo
que óvulos] e embriões [fecundação entre óvulo e espermatozoide] a
serem transferidos no caso de doação: estes devem ser respeitada a idade
da doadora e não da receptora. José Hiran Gallo explica que a decisão
se dá porque a qualidade dos óvulos doados são maiores: “a paciente
acima de 40 anos tem probabilidade de engravidar em torno 10%, já as
pacientes menores de 35 tem chances acima de 40%. Essa
limitação reduz as chances de gestação múltipla, que seria mais um fator
de risco para mulheres mais velhas. É preciso ficar atento à maturidade
desses óvulos e não de sua receptora”.
Diversidade -
Outra questão abordada na nova norma do CFM diz respeito ao tratamento
de reprodução para casais homoafetivos. A resolução anterior dizia que
"qualquer pessoa" poderia ser submetida ao procedimento "nos limites da
resolução", no entanto os casais formados por pessoas de mesmo sexo
esbarravam em diferentes interpretações. Agora a resolução do CFM deixou
mais claro esse direito: “é permitido o uso das técnicas de reprodução
assistida para relacionamentos homoafetivos e pessoas solteiras,
respeitado o direito da objeção de consciência do médico”.
De
acordo com o presidente do CFM, Roberto d’Avila, a aprovação da medida é
um avanço porque “permite que a técnica seja desenvolvida em todas as
pessoas, independentemente de estado civil ou orientação sexual. É uma
demanda da sociedade moderna. A medicina não tem preconceitos e deve
respeitar todos de maneira igual”.
Para
auxiliar nesses casos o CFM ampliou o parentesco para doadoras
temporárias do útero. Estas devem pertencer à família de um dos
parceiros num parentesco consanguíneo até o quarto grau (primeiro grau –
mãe; segundo grau – irmã/avó; terceiro grau – tia; quarto grau –
prima). Em todos os casos também devem respeitada a idade limite de até
50 anos.
Descarte -
Com base em decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que autoriza o
uso de embriões para pesquisa com células tronco, e considerando o
crescente estoque de material genético, o texto, elaborado pela Câmara
Técnica de Reprodução Assistida do CFM, também abordou este tema.
Uma
das alterações da Resolução trata do descarte de embriões que estão nas
clinicas de reprodução assistida e que não serão mais utilizados pelos
casais, como os casos dos que já tiveram seus filhos, estão em
separação, ou houve morte de um dos cônjuges. Existem muitos embriões
que estão abandonados há 15 anos e não são aproveitados.
Segundo
a norma do CFM, após cinco anos, os embriões criopreservados podem ser
doados para outros pacientes; doados para pesquisas; ou descartados.Se
for da vontade do paciente, esses embriões também podem continuar
congelados desde que os pacientes expressem essa vontade e assumam as
responsabilidades por essa decisão.
Relatório
da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aponta que no
Brasil 26.283 embriões foram congelados somente no ano de 2011. Para
congelar esses embriões, os casais pagam uma taxa que varia entre R$ 600
e R$ 1,2 mil, e para mantê-los neste processo é preciso arcar com uma
mensalidade. Entretanto cerca de 80% desse material é abandonado pelos
pacientes e o banco que arca com as despesas da manutenção repondo
nitrogênio e garantindo espaço físico. “A responsabilidade técnica deste
material abandonado só ficará a cargo da clínica por cinco anos.
Faremos uma convocação desses casais que já abandonaram os embriões e
conscientizaremos os próximos pacientes das possibilidades de doação e
descarte”, declarou Adelino Amaral.
Principais contribuições da Resolução CFM nº 2.013/13:
IDADE DA PACIENTE - A idade máxima das candidatas à gestação de reprodução assistida é de 50 anos.
DOAÇÃO COMPARTILHADA - Libera a medida e limita a idade da doadora em 35 anos.
IDADE LIMITE PARA DOAÇÃO DE ESPERMATOZOIDES - 50 anos.
ÚTERO DE SUBSTITUIÇÃO - Ampliou-se para parentesco consanguíneo de até 4º grau.
TRANSFERÊNCIA
- A nova redação também deixa mais claro quanto ao número de oócitos e
embriões a serem transferidos no caso de doação: estes devem ser
respeitado a idade da doadora e não da receptora.
DESCARTE - os embriões criopreservados acima de cinco anos, poderão ser descartados se esta for a vontade dos pacientes.
HOMOAFETIVIDADE
– É permitido o uso das técnicas de reprodução assistida para
relacionamentos homoafetivos e pessoas solteiras, respeitado o direito
da objeção de consciência.
Fonte: Portal Médico |
Jurisprudência. Decisão do STJ. Responsabilidade civil de blog por publicação
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meio da internet. Nesse contexto, cabe ao titular do blog exercer
o controle editorial das matérias a serem postadas, de modo a evitar a
propagação de opiniões pessoais que contenham ofensivos à dignidade
pessoal e profissional de outras pessoas. REsp 1.381.610-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 3/9/2013.
24 outubro 2013
Diferença de um centavo não gera deserção, diz TST
A falta de apenas um centavo no depósito exigido para o ajuizamento
de recurso no Tribunal Superior do Trabalho não gera deserção que
prejudique o julgamento do pedido. O entendimento é da 8ª Turma do
Tribunal Superior do Trabalho, que afastou deserção decretada pelo
presidente do TST, ministro João Orestes Dalazen, em Agravo de
Instrumento interposto pela empresa K. N. do Brasil, em cujo
depósito recursal faltava um centavo.
Para a relatora, ministra
Dora Maria da Costa, não houve deserção. O entendimento se baseia na
Orientação Jurisprudencial 140, que afirma ser deserto o recurso quando o
recolhimento das custas e do depósito for insuficiente. "Trata-se de
quantia sem expressão monetária, sendo certo, ainda, que a OJ 140 da
SDI-1 se reporta a centavos, no plural, o que não abrange a situação
vertente", afirmou, e negou provimento ao agravo, sendo seguida pelos
demais membros do colegiado.
“Essa decisão foi arrojada, mostrando
que o tribunal não está enclausurado em sua jurisprudência e que existe
possibilidade de rediscussão dessa matéria no TST. Aí está a
importância dos advogados em provocar uma discussão nesse sentido”,
opinou o advogado Maurício Veiga, que não atua no caso.
Notas:
1. Deserção: "Deserção de recursos significa o abandono processual pelas partes em
decorrência do não recolhimento das custas devidas, em prazo
regimental". (v. Glossário Jurídico do STF)
2. TST. Orientação jurisprudencial 140: "Ocorre
deserção do recurso pelo recolhimento insuficiente das custas e do
depósito recursal, ainda que a diferença em relação ao “quantum” devido
seja ínfima, referente a centavos".
3. Em negrito, foram ressaltados o argumento literal da relatora (em oposição ao argumento literal do presidente do TST) e a opinião de um advogado da área.
4. Leia aqui a coluna de Lenio Streck que considerou ter havido um avanço no campo do Direito.
Será?
Apontamentos críticos e provocativos sobre a relativização da coisa julgada: um novo enfoque para uma instigante controvérsia
OBS. Texto destinado unicamente àqueles que desejam tentar aventurar-se um pouco mais na noção de coisa julgada.
Umberto PAULINI
1.
Introdução; 2. Esclarecimentos preliminares acerca dos conceitos de
coisa julgada material, coisa julgada formal e preclusão; 3. O valor
constitucional da coisa julgada material; 4. Erro ao aplicar a máxima da
proporcionalidade como critério de relativização da coisa julgada:
trata-se de uma regra e não de um princípio; 5. Uma nova proposta de
relativização da coisa julgada: circunstâncias (e não direitos) que
poderiam ensejar sua desconsideração; 6. Conclusão; 7. Referências
Bibliográficas.
1. Introdução
O presente ensaio tem como objetivo
apresentar ao leitor um novo enfoque da problemática da relativização da
coisa julgada a partir da premissa de que o instituto em questão
caracteriza-se como sendo uma regra e não um princípio. Para tanto, a
jornada proposta terá como ponto de partida a compreensão da distinção
entre os conceitos de coisa julgada material, coisa julgada formal e
preclusão. Logo em seguida, será colocado em voga o valor constitucional
da coisa julgada, expondo-se os motivos que levam a qualificá-la como
verdadeiro direito fundamental. Mais à frente, uma análise detalhada da
distinção entre princípios e regras levará ao entendimento de que a
máxima da proporcionalidade não é um instrumento adequado para a
relativização da coisa julgada, pois esta é uma regra. Como apenas um
motivo extremamente forte pode levar a não aplicação de uma regra em
favor de um princípio, estuda-se, ao final, um critério de relativização
da coisa julgada fundado em circunstâncias (e não direitos) que
poderiam macular a própria ideia de jurisdição.
Deixa-se em aberto, evidentemente, a
pesquisa sobre outros inúmeros enfoques que a imbricação dos temas
apresentados poderia revelar, uma vez que o presente ensaio não possui a
pretensão de esgotar a problemática atinente ao assunto discorrido,
mesmo porque tal tarefa demandaria muito mais do que este simples estudo
jurídico.
2. Esclarecimentos preliminares acerca dos conceitos de coisa julgada material, coisa julgada formal e preclusão
Não há como falar em relativização da coisa
julgada sem antes delinear o que, em verdade, este instituto
representa, bem como o seu respectivo alcance e terreno de atuação. A
falta de tais definições poderia criar dois riscos em sentidos opostos.
Por um lado, arrisca-se cogitar de falsos problemas de “coisa julgada a
relativizar”, ou seja, atribuir a coisa julgada a situações em que ela
não se faz presente. Por outro, há o risco da pretensa solução de
problemas que verdadeiramente envolvem “coisa julgada” mediante
artifícios destinados a negar sua ocorrência.[1] Daí
a importância de um capítulo preliminar voltado ao estudo de conceitos
utilizados pela manualística e pela jurisprudência sem uma reflexão mais
apurada.
Como assevera Cândido Rangel DINAMARCO, um
dos valores buscados pela ordem jurídico-processual é o da segurança nas
relações jurídicas, de maneira que “as decisões judiciárias, uma vez
tomadas, isolam-se dos motivos e do grau de participação dos
interessados e imunizam-se contra novas razões ou resistências que se
pensasse em opor-lhes”.[2] O curso processual leva o pronunciamento judicial a um ponto de firmeza que se qualifica como estabilidade e que varia de grau conforme o caso. O mais elevado grau de estabilidade dos atos estatais é representado pela coisa julgada que, na conhecida acepção de LIEMAN, é definida como imutabilidade da sentença e de seus efeitos.[3]
Contudo, quando na prática jurídica faz-se menção à ideia de coisa julgada, na maioria das vezes, está-se referindo à coisa julgada material, muito embora a coisa julgada formal não
represente outro instituto de substância diversa, pois se trata apenas
de dois aspectos do mesmo fenômeno (imutabilidade dos efeitos da
sentença), ambos responsáveis pela segurança nas relações jurídicas. O
ponto que separa os dois institutos diz respeito tão somente à extensão da referida imutabilidade: intraprocessual ou extraprocessual.
Segundo Eduardo TALAMINI, a coisa julgada
material pode ser configurada como “uma qualidade de que se reveste a
sentença de cognição exauriente de mérito transitada em julgado,
qualidade essa consistente na imutabilidade do conteúdo do comando
sentencial”.[4]Uma
vez consumada, reputa-se consolidada no presente e para o futuro a
situação jurídico-material das partes, relativa ao objeto do julgamento e
às razões que uma delas tivesse para sustentar ou pretender alguma
outra situação. Toda possível dúvida está definitivamente dissipada,
quanto ao modo como aqueles sujeitos se relacionaram juridicamente na
vida comum, ou quanto à pertinência de bens a um deles.[5]
No tocante ao âmbito de incidência, a coisa julgada pode recair apenas sobre atos jurisdicionais.Mais especificamente, mesmo entre os atos jurisdicionais, apenas aqueles que contenham um suficiente grau de intensidade de cognição são
compatíveis com a coisa julgada. Nesse sentido, não são todos os atos
jurisdicionais decisórios que fazem coisa julgada. Aliás, revela-se
inadequado o conceito de coisa julgada presente na Lei de Introdução ao
Código Civil [hoje chamada de Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro], que vincula a coisa julgada a toda “decisão judicial de
que já não caiba recurso”. No sistema de direito positivo, é o art.
485 do Código de Processo Civil que estabelece de modo mais preciso o
âmbito de incidência da coisa julgada material, ao prever para sua
desconstituição a ação rescisória em face de “sentença de mérito
transitada em julgado”.
Registre-se, portanto, que apenas a sentença que decide o mérito da demanda –
que pode ser representado por um direito, por uma relação jurídica ou
por uma situação processual – estará apta a fazer coisa julgada
material. Assim, estão alheios à coisa julgada material os atos
judiciais não decisórios (por exemplo, os atos executivos), as decisões
interlocutórias, as sentenças que extinguem o processo sem julgamento de
mérito, as sentenças que encerram o processo executivo (pois não julgam
o mérito) e as sentenças de cognição sumária (por exemplo, nos
processos urgentes, na jurisdição voluntária, etc.).[6]
Outro aspecto da coisa julgada material está ligado ao trânsito em julgado. Não basta tratar-se de sentença de mérito. Para que se estabeleça a coisa julgada é preciso que estejam esgotadas as possibilidades de alteração da sentença mediante mecanismos internos ao processo em
que ela foi proferida. Note-se, porém, que o trânsito em julgado e a
coisa julgada não se confundem. Evidentemente, não há coisa julgada sem
que tenha havido o trânsito em julgado, mas nem sempre o trânsito em
julgado traz consigo a coisa julgada material, podendo formar-se sobre a
pretensão deduzida em juízo somente a coisa julgada formal, de que se
fala mais adiante.[7]
Notas:
[1] TALAMINI, Eduardo. Coisa julgada e sua revisão. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. p. 30.
[2] DINAMARCO, Candido Rangel. Relativizar a coisa julgada material. In.: NASCIMENTO, Carlos Valder do (org.).Coisa Julgada Inconstitucional. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2002. p. 36.
[3] Idem, ibidem.
[4] TALAMINI, Eduardo. Op. Cit. p. 30.
[5] DINAMARCO, Candido Rangel. Op. Cit. p. 37.
[6] TALAMINI, Eduardo. Op. Cit. p. 31.
[7] Idem. p. 32.
22 outubro 2013
Os últimos 25 anos e o futuro
Em
estudo sobre a cultura jurídica dos países latino-americanos,
especialmente voltado para a experiência brasileira, um dos maiores
historiadores do direito da atualidade, António Manuel Hespanha1
realiza, de forma sintética, um balanço dos sucessos e das frustrações
destes primeiros 25 anos de vigência da Constituição Cidadã de 1988.2
O saldo, indiscutivelmente, é positivo. Conforme salienta o autor, o
“caso brasileiro” tem revelado uma concepção crítica e socialmente
comprometida do Direito, de tal modo que, em termos comparativos, o
discurso jurídico europeu não mais se pode considerar inovador ou de
vanguarda. O processo pode ser representado a partir de inúmeros
fatores: a mudança do texto constitucional para uma posição central no
ordenamento jurídico; o reconhecimento da força normativa das
disposições constitucionais; a substituição de um positivismo legalista
por um positivismo constitucional; a consequente ampliação do papel do
juiz na concretização do conteúdo dos princípios extraídos da
Constituição; o ativismo judicial e a crença no papel emancipatório e
transformador da hermenêutica jurídica.
Assim delineou-se o direito
constitucionalizado brasileiro após 1988, cada vez mais consciente de
seu compromisso para com a promoção dos valores personalistas e
solidaristas pretendidos pelo constituinte. Em perspectiva comparatista,
observa Hespanha: “Enquanto na Europa a doutrina e o foro tendem a
alinhar por padrões de julgamento orientados para aspetos técnicos,
geralmente alheios às impuras problemáticas humanas e sociais e
favoráveis ao Direito reconhecido por um jet set de juristas
cosmopolitas, a judicatura brasileira está muito ligada ao ciclo
contemporâneo da cultura política pop latino-americana, social e
politicamente comprometida, confiante nas virtualidades das formas
civilizacionais aí emergentes”.3
A revolução que essa perspectiva
representa para a própria compreensão do papel do Direito na sociedade é
inegável, mas a forma como o processo vem se desenvolvendo não ocorre
sem sacrifício: não à toa, a invocação (e, não raro, a defesa
honestamente intencionada) dos princípios constitucionais vem
acompanhada de uso completamente atécnico e assistemático dos conceitos,
institutos e instrumentos jurídicos já conhecidos pelo intérprete, numa
aparente tentativa de inventar a roda quadrada.
De fato, embora se esteja criando um
direito brasileiro no que tange aos objetivos e valores socialmente
relevantes buscados pelo jurista no Brasil atual, voltado para a solução
dos problemas nacionais, falta-nos ainda a técnica jurídica adequada
para acompanhá-los. Em nossa defesa, é preciso lembrar que, assim como
ocorreu nas primeiras duas décadas do século passado – reputado o breve
século XX – vivemos em um período de grande indefinição. Sabemos quais
são os problemas, mas, aparentemente, ainda não temos os instrumentos
necessários para solucioná-los. Segundo Zygmunt Bauman, vivemos em um
período de interregno (“inter rex”), semelhante ao que ocorreu em Roma
na lendária transição do trono em virtude da morte de Rômulo, seu mítico
fundador.
Se, por um lado, como observa Hespanha,
“na origem dessa nova perspectiva crítica do Direito está a ideia social
e politicamente militante de que a dogmática jurídica e aqueles que a
cultivam devem estar comprometidos com objetivos de política social; não
interessando tanto o sentido em que estes são concretizados, mas o
simples fato de se reconhecer que o Direito e os juristas devem
responder aos problemas da sociedade”;4
por outro lado, faz-se necessário alertar que a consolidação da
metodologia pós-positivista e da constitucionalização do direito civil
tem sinalizado para um perigo crescente: a superação do formalismo por
uma perspectiva mais flexível e principiológica deu lugar, e agora nos
deparamos com o risco oposto, ao excessivo voluntarismo judicial. O
receio dos juristas tradicionais parece encontrar eco quando nos
deparamos com decisões que, sob o pretexto da constitucionalização e da
aplicação dos princípios, mais parecem realizar o que já foi chamado de
“carnavalização” do Direito.5
Não sem algum paradoxo – especialmente
em se considerando que a tradição dos países da família romano-germânica
sempre foi a de apresentar um direito de professores, mais do que a de
um direito dos tribunais –, poder-se-ia acrescentar à análise de
Hespanha a constatação de que, mais do que um agigantamento do papel da
doutrina na interpretação e concretização dos princípios que passaram a
ocupar este papel central no ordenamento, o direito legislado e
teoricamente majoritário tem sido substituído, no Brasil atual, cada vez
mais pelo direito julgado, produzido pela magistratura. Ainda seguindo a
tendência da importação “à brasileira” de modelos estrangeiros, tem-se
assistido a uma progressiva aproximação do sistema brasileiro a um
modelo que remete ao da common law – não fosse o fato, prontamente
apontado pela doutrina mais atenta, de que a cada vez maior vinculação
das decisões judiciais pretéritas não foi acompanhada, no Brasil, do
arcabouço teórico e instrumental com que conta nos países
anglo-saxônicos.6
A superação de uma aplicação robótica da
lei não pode servir de pretexto para se conferir à magistratura carta
branca para decidir de acordo com suas concepções pessoais, mediante a
invocação genérica de algum princípio constitucional que o juiz acredite
amparar sua própria e individual versão de justiça.7
Portanto, seja a constatação de que vivemos em uma era de incertezas,
seja a de que o mecanismo de aplicação do Direito é hoje guiado por uma
lógica, por assim dizer, informal (“fuzzy”) não permite abrir mão da
segurança jurídica. A previsibilidade das decisões judiciais é também
uma questão de justiça, pois decorre da necessária coerência e harmonia
que devem caracterizar o sistema.8
Ao que parece, parte do Judiciário não percebeu que a derrubada do
limite externo, formal, que restringia o intérprete – o dogma da
subsunção – não significou a consagração do arbítrio, mas, ao contrário,
impôs um limite interno, – metodológico: a exigência de fundamentação
argumentativa da sentença.
À míngua de instrumentos criados
especificamente para estes novos objetivos e de uma academia jurídica
plenamente consolidada, o direito brasileiro ainda recorre a
tradicionais modelos estrangeiros: “a doutrina europeia e
norte-americana continua a ser citada e usada; mas recebida de forma
pragmática e ‘impura’, usada de forma tópica, por vezes para obter
resultados que não têm muito a ver com a sua lógica original”.9
Sem a tradição da common law, mas com a importação da noção de precedentes vinculantes,10
é de se duvidar que o intérprete brasileiro disponha de técnica
necessária para produzir a distinção entre casos concretos aos quais se
aplica ou não determinado precedente (o chamado distinguishing nos
países anglo-saxões).11
O projeto do novo Código de Processo Civil é um dos exemplos mais
emblemáticos do caminhar, talvez irreversível, em direção à construção
desse modelo norte-sul-americano de um direito dos juízes – e um exemplo
ainda melhor de como a doutrina nacional precisa elaborar com urgência a
hermenêutica, os instrumentos legais e mesmo o ensino jurídico desta
nova realidade, sob pena da ruína do sistema.
Maria Celina Bodin de Moraes
————
1Professor Emérito da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa. Doutor Honoris Causa pela Université de Lucerne,
na Suíça (2010) e pela Universidade Federal do Paraná (2013). Professor
visitante em diversas instituições universitárias portuguesas e
estrangeiras (Bélgica, Espanha, França, Alemanha, Itália, Noruega,
Suécia, Suíça, Argentina, Brasil, Canadá, Estados Unidos da América,
México, China, Índia) e autor de numerosas obras científicas, dentre as
quais se incluem: A História do Direito na História Social, 1977; História das Instituições. Épocas medieval e moderna, 1982; Lei, Justiça, Litigiosidade. História e prospectiva, 1993; História de Portugal moderno. Político-institucional, 1995 (ed. brasileira, 2006); Cultura Jurídica Europeia. Síntese de um milénio, 1996 (ed. ital. Bologna, 2000; ed. cast. Madrid, 2002; ed. brasileira, 2005); O caleidoscópio do direito. O direito e a justiça no mundo dos nossos dias, Almedina, 2007; Hércules confundido. “Sentidos improváveis e variados do constitucionalismo oitocentista. O caso português”, Juruá, 2009 e Caleidoscópio do Antigo Regime, Alameda, 2010.
2As culturas jurídicas dos mundos emergentes. O caso brasileiro. Revista da Faculdade de Direito – UFPR, Curitiba, n. 56, p. 13-21, 2012.
3Idem, p. 20.
4António Manuel Hespanha, As culturas jurídicas dos mundos emergentes, cit., p. 15.
5Daniel Sarmento. Ubiquidade constitucional: os dois lados da moeda. In C. P. de Souza Neto e D. Sarmento (coord.). A constitucionalização do Direito. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, pp. 113-148.
6Demonstra primorosamente as razões do
permanente descompasso entre os dois sistemas Richard Hyland. Shall We
Dance? In P. Cappellini e B. Sordi (ed.). Codici: una riflessione
di fine millennio. Milano: Giuffrè, 2002, p. 377-400, texto cuja
tradução já foi gentilmente autorizada pelo autor para publicação no
próximo número da civilistica.com.
7Sobre o tema, por todos, v. Luiz Werneck Vianna et al. A judicialização da política e das relações sociais no Brasil. Rio de Janeiro: Revan, 1999.
8Sobre o tema, Ricardo Garcia Manrique. Acerca del valor moral de la seguridad jurídica. Doxa, n. 26 (2003). Sobre a compatibilidade entre segurança jurídica e superação do formalismo, v. Antonio- Enrique Pérez Luño. La seguridad jurídica. Barcelona: Ariel, 1994.
9António Manuel Hespanha, As culturas jurídicas dos mundos emergentes, cit., p. 16.
10Constituição Federal, art. 103-A.
11Embora atualmente seja comum a referência ao
termo “precedente”, especialmente pelos Tribunais Superiores, não se
trata da mesma coisa: o nosso precedente, necessariamente plural e relativo ao direito,
denota, na verdade, o comportamento da “jurisprudência”, enquanto o
“precedente” em sua acepção original, de matriz anglo-americana,
normalmente é único e refere-se aos fatos principais da
demanda. Trata-se, portanto, de diferenças estruturais, qualitativas e
quantitativas. Para essas e outras considerações acerca das
consequências da mencionada diferença, v. Michele Taruffo. Precedente e giurisprudenza. Roma: Editoriale scientifica, 2007, passim.
21 outubro 2013
Força-tarefa nos EUA propõe reforma do ensino jurídico
Excelente artigo de Otávio Luiz Rodrigues Jr., professor da USP e colunista do CONJUR
Inicio esta coluna com um pedido de desculpas pela extensíssima citação que a inaugura, o que contraria as melhores normas de edição jornalística e mesmo as atuais regras de boa redação científica (...)
[http://www.conjur.com.br/2013-out-09/direito-comparado-forca-tarefa-eua-propoe-reforma-ensino-juridico]
Inicio esta coluna com um pedido de desculpas pela extensíssima citação que a inaugura, o que contraria as melhores normas de edição jornalística e mesmo as atuais regras de boa redação científica (...)
[http://www.conjur.com.br/2013-out-09/direito-comparado-forca-tarefa-eua-propoe-reforma-ensino-juridico]
14 outubro 2013
08 outubro 2013
Cum grano salis
Diz-se que a expressão cum grano salis (expressão latina que significa "com um grão de sal") remonta a Plínio, o Velho, que a usou em sua obra sobre História Natural (Historia Naturalis XXIII, 149), afirmando que o General Pompeu possuía um
remédio contra o veneno de determinada cobra e recomendando que ao usar o antídoto se tomasse o cuidado de adicionar um grão de sal ("addito grano salis" depois transformado em "cum grano salis").
A interpretação da frase original, porém, é incerta. Não se sabe se o sal indicado por Plínio servia para tornar o antídoto eficaz ou se, ao contrário, Plínio já tinha dúvidas sobre a eficácia da receita e, por isso, ironicamente, recomendou a adição de um único grão de sal.
A compreensão mais culta indica que cum grano salis é termo atualmente usado para restringir a declaração e tornar o ouvinte/leitor consciente de que o que é dito não pode ser tomado literalmente, mas, pode ser sarcástico ou formulado com exagero, e, portanto, apenas com reservas ("por alto") deve ser compreendido. Nesse caso, portanto, a expressão é usada para que ressalvar que afirmação não precisa ser verdadeira em todos os aspectos, podendo ser verdadeira em apenas "um grão", isto é, em um único aspecto.
No sentido acima indicado veja-se aqui e aqui.
Todavia, como prova de que a Internet deve ser usada cum grano salis, encontra-se com facilidade e frequência a interpretação oposta, isto é, o sentido de que a afirmação a que se refere deve ser considerada muito seriamente.
A interpretação da frase original, porém, é incerta. Não se sabe se o sal indicado por Plínio servia para tornar o antídoto eficaz ou se, ao contrário, Plínio já tinha dúvidas sobre a eficácia da receita e, por isso, ironicamente, recomendou a adição de um único grão de sal.
A compreensão mais culta indica que cum grano salis é termo atualmente usado para restringir a declaração e tornar o ouvinte/leitor consciente de que o que é dito não pode ser tomado literalmente, mas, pode ser sarcástico ou formulado com exagero, e, portanto, apenas com reservas ("por alto") deve ser compreendido. Nesse caso, portanto, a expressão é usada para que ressalvar que afirmação não precisa ser verdadeira em todos os aspectos, podendo ser verdadeira em apenas "um grão", isto é, em um único aspecto.
No sentido acima indicado veja-se aqui e aqui.
Todavia, como prova de que a Internet deve ser usada cum grano salis, encontra-se com facilidade e frequência a interpretação oposta, isto é, o sentido de que a afirmação a que se refere deve ser considerada muito seriamente.
01 outubro 2013
O monumental problema das falsas memórias
N.B.: Quem tiver dificuldades em entender o inglês falado, especialmente em uma palestra interessante como essa, deve recorrer às legendas no próprio idioma - o que é, by the way, uma das melhores formas de treinar uma língua estrangeira. Não há, ainda, legendas em pt.
26 setembro 2013
25 setembro 2013
Decisão inusitada
A Escola Nacional de Magistratura incluiu em seu banco de sentenças, decisão "incomum" do juiz Rafael Gonçalves de Paula, da 3ª Vara
Criminal da Comarca de Palmas, em Tocantins. Parece, inacreditavelmente, que entidade considerou de "bom senso" a decisão do juiz,
mandando soltar S. R. R. e H. R. R.,
detidos sob acusação de furto de duas melancias:
DECISÃO PROFERIDA NOS AUTOS DO PROCESSO Nº 124/03 - 3ª Vara Criminal da Comarca de Palmas, Tocantins
DECISÃO
Trata-se de auto de prisão em flagrante de Saul R. Rocha. e Hagamenon R. Rocha, que foram detidos em virtude do suposto furto de duas (2) melancias.
Instado a se manifestar, o Sr. Promotor de Justiça opinou pela manutenção dos indiciados na prisão.
Para conceder a liberdade aos indiciados, eu poderia invocar inúmeros fundamentos: os ensinamentos de Jesus Cristo, Buda e Ghandi, o Direito Natural, o princípio da insignificância ou bagatela, o princípio da intervenção mínima, os princípios do chamado Direito alternativo, o furto famélico, a injustiça da prisão de um lavrador e de um auxiliar de serviços gerais em contraposição à liberdade dos engravatados e dos políticos do mensalão deste governo, que sonegam milhões dos cofres públicos, o risco de se colocar os indiciados na Universidade do Crime (o sistema penitenciário nacional)...
Poderia sustentar que duas melancias não enriquecem nem empobrecem ninguém. Poderia aproveitar para fazer um discurso contra a situação econômica brasileira, que mantém 95% da população sobrevivendo com o mínimo necessário apesar da promessa deste presidente que muito fala, nada sabe e pouco faz.
Poderia brandir minha ira contra os neoliberais, o consenso de Washington, a cartilha demagógica da esquerda, a utopia do socialismo, a colonização europeia....
Poderia dizer que George Bush joga bilhões de dólares em bombas na cabeça dos iraquianos, enquanto bilhões de seres humanos passam fome pela Terra - e aí, cadê a Justiça nesse mundo?
Poderia mesmo admitir minha mediocridade por não saber argumentar diante de tamanha obviedade.
Tantas são as possibilidades que ousarei agir em total desprezo às normas técnicas: não vou apontar nenhum desses fundamentos como razão de decidir. Simplesmente mandarei soltar os indiciados. Quem quiser que escolha o motivo.
Expeçam-se os alvarás.
Intimem-se.
Rafael Gonçalves de Paula
Juiz de Direito
02 setembro 2013
20 agosto 2013
O jeito na cultura brasileira
Prezados alunos,
O que é o jeitinho brasileiro?
O "jeitinho brasileiro" na visão dos gringos
Valor Econômico - 04/01/2010
Dificuldades com o idioma e o medo da violência são algumas das dificuldades mais óbvias enfrentadas pelos estrangeiros que se mudam a trabalho para o Brasil. O país, contudo, apresenta uma diversidade cultural e uma complexidade social que pode confundir quem chega desprevenido para fazer negócios. Mesmo porque, os brasileiros não costumam separar a vida pessoal da profissional.
Entrar em uma negociação de maneira formal e sem fazer uma socialização prévia, por exemplo, pode ser considerado grosseiro. "Os brasileiros gostam de ter alguma intimidade com a outra pessoa, para sentir que estão fazendo negócios com alguém de confiança. Antes de entrarem no que interessa, perguntam do fim de semana e puxam assuntos genéricos", afirma o holandês Joris Steinberg.
Há dois anos no Brasil, Steinberg veio cursar um MBA no Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação em Administração de Empresas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppead/ UFRJ), já com o intuito de aprender português, trabalhar e morar na cidade - hoje ele é consultor sênior da Visagio, empresa de consultoria e desenvolvimento em engenharia de gestão. O choque cultural e as dificuldades que passou desde que chegou ao Rio o levaram a pesquisar o assunto mais profundamente em sua tese de mestrado do curso.
Conversando com pessoas oriundas de diversos países como Alemanha, Japão, Estados Unidos, Inglaterra e Israel, Steinberg, notou que a origem de cada um pode acentuar uma ou outra dificuldade, mas a percepção geral dos estrangeiros em relação aos brasileiros e, mais especificamente aos cariocas, é bastante parecida. "Problemas com burocracia, impontualidade, excesso de informalidade no ambiente de trabalho, falta de planejamento e o caráter indireto da comunicação são sempre os fatores que mais incomodam", afirma.
Este último quesito, aliás, chega a ser um problema até mesmo para os portugueses. "Claro que não tenho grandes dificuldades com a linguagem verbal, mas é preciso também saber ler nas entrelinhas. Enrolar a situação para não ter que dizer 'não', por exemplo, é normal para os brasileiros", afirma João Gonçalves, sócio de uma empresa de marketing de tecnologia em novas formas de mídia e há quase dois anos morando no Rio.
Acostumado a ser direto e objetivo, o analista americano Andrew de Simone percebeu rápido que para ter sucesso precisava ser mais sociável e não focar apenas o trabalho. Há dois anos e meio no Brasil, ele acha que mostrar simpatia e vontade de fazer parte do grupo é tão importante quanto ter habilidades técnicas. "Nos Estados Unidos, ninguém estranha se um funcionário é sério, solitário ou fechado. O importante é ele ser competente. Aqui, é fundamental se relacionar", explica.
Andrew, porém, considera essa característica uma vantagem. "O dia a dia fica melhor, mais leve. As pessoas geralmente são bem humoradas e menos rígidas, o que torna o ambiente agradável", diz. Em um primeiro momento, no entanto, isso pode ser entendido pelo estrangeiro como falta de seriedade, explica Vivian Leite, diretora da Goingplaces, consultoria que prepara pessoas para trabalhar em outros países.
De acordo com ela, o ambiente de trabalho mais descontraído e amigável é uma das coisas que mais fazem falta para quem vem trabalhar no Brasil e depois volta para casa. "Eles descobrem que é possível ser profissional sem ter de parecer sério e formal o tempo todo. E não conseguirão mudar isso em seus países de origem", diz. Ao mesmo tempo, Andrew acha que o estilo mais personalizado de liderar e de negociar acaba fazendo com que a hierarquia seja mais temida, o que na opinião dele é um ponto negativo. "As pessoas têm medo de confrontar os seus superiores e até mesmo de denunciar alguma injustiça. Nos EUA isso não acontece, pois se confia plenamente que o sistema protegerá o indivíduo. Aqui, protege-se o sistema."
Mariana Barros, diretora da Differance, empresa que oferece assistência para profissionais expatriados, afirma que a partir do momento que o estrangeiro entende as raízes de determinados comportamentos e atitudes, os preconceitos são quebrados. "O objetivo é fazê-lo entender não apenas como as coisas funcionam, mas os motivos disso. Quando a pessoa tem esse olhar abrangente, é como se caísse a ficha e tudo começa a fluir mais facilmente."
Joris Steinberg diz que mesmo comportamentos que considerava ineficientes mostraram ter suas vantagens. Logo, não é uma questão de quem é melhor ou pior, mas de saber trabalhar com as diferenças. "Os brasileiros têm o costume de deixar as coisas para a última hora. O planejamento fica sempre em aberto e se trabalha muito com a incerteza. A partir daí, porém, surgem a criatividade e a flexibilidade para resolver imprevistos, além de uma tolerância maior com os prazos", afirma o holandês, acostumado com modelos de trabalho mais rígidos e engessados.
Para Mariana Barros, as empresas multinacionais já se deram conta de que a cultura é importante para o bom desempenho do executivo e não deve ser desprezada. Deve-se, portanto, estudar a cultura de onde se vai entrar antes para evitar prejuízos depois. "Não adianta estereotipar. É preciso aprender a negociar os conflitos e incorporar as diferenças", diz. Na opinião de Vivian Leite os estrangeiros precisam entender que, pelo menos no curto prazo, são eles que devem se adequar ao ritmo dos colegas e não o contrário. "Se ele chegar tentando impor suas condições na força, sem respeitar as características locais e nem ouvir a equipe, será boicotado", ressalta.
Para quem viaja sozinho em busca de trabalho em outros países, sem o apoio de uma empresa ou de uma consultoria especializada, a dica de Mariana é buscar informações e networking em redes sociais específicas para expatriados como a InterNations (www.internations.org).
De maneira geral, contudo, os estrangeiros concordam que quem tiver disposição, vontade e mente aberta poderá aproveitar o tempo que viver no Brasil tanto pelo lado profissional quanto pessoal. A hospitalidade e a receptividade dos brasileiros, aliás, são fatores frequentemente elogiados por quem vem de fora. Segundo Steinberg, parte disso se deve também pelo fato de não haver uma barreira física. "Qualquer pessoa do mundo poderia ser brasileira. Não há um biótipo padrão aqui, então a integração fica mais fácil. Em determinados países o estrangeiro destoa da população local, sente-se um completo estranho e passa a ser tratado de forma diferente por conta disso."
Quem tiver mais interesse no tema, procure o livro de Keith Rosen chamado O jeito na cultura brasileira, da Editora Renovar.
O que é o jeitinho brasileiro?
O "jeitinho brasileiro" na visão dos gringos
Valor Econômico - 04/01/2010
Dificuldades com o idioma e o medo da violência são algumas das dificuldades mais óbvias enfrentadas pelos estrangeiros que se mudam a trabalho para o Brasil. O país, contudo, apresenta uma diversidade cultural e uma complexidade social que pode confundir quem chega desprevenido para fazer negócios. Mesmo porque, os brasileiros não costumam separar a vida pessoal da profissional.
Entrar em uma negociação de maneira formal e sem fazer uma socialização prévia, por exemplo, pode ser considerado grosseiro. "Os brasileiros gostam de ter alguma intimidade com a outra pessoa, para sentir que estão fazendo negócios com alguém de confiança. Antes de entrarem no que interessa, perguntam do fim de semana e puxam assuntos genéricos", afirma o holandês Joris Steinberg.
Há dois anos no Brasil, Steinberg veio cursar um MBA no Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação em Administração de Empresas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppead/ UFRJ), já com o intuito de aprender português, trabalhar e morar na cidade - hoje ele é consultor sênior da Visagio, empresa de consultoria e desenvolvimento em engenharia de gestão. O choque cultural e as dificuldades que passou desde que chegou ao Rio o levaram a pesquisar o assunto mais profundamente em sua tese de mestrado do curso.
Conversando com pessoas oriundas de diversos países como Alemanha, Japão, Estados Unidos, Inglaterra e Israel, Steinberg, notou que a origem de cada um pode acentuar uma ou outra dificuldade, mas a percepção geral dos estrangeiros em relação aos brasileiros e, mais especificamente aos cariocas, é bastante parecida. "Problemas com burocracia, impontualidade, excesso de informalidade no ambiente de trabalho, falta de planejamento e o caráter indireto da comunicação são sempre os fatores que mais incomodam", afirma.
Este último quesito, aliás, chega a ser um problema até mesmo para os portugueses. "Claro que não tenho grandes dificuldades com a linguagem verbal, mas é preciso também saber ler nas entrelinhas. Enrolar a situação para não ter que dizer 'não', por exemplo, é normal para os brasileiros", afirma João Gonçalves, sócio de uma empresa de marketing de tecnologia em novas formas de mídia e há quase dois anos morando no Rio.
Acostumado a ser direto e objetivo, o analista americano Andrew de Simone percebeu rápido que para ter sucesso precisava ser mais sociável e não focar apenas o trabalho. Há dois anos e meio no Brasil, ele acha que mostrar simpatia e vontade de fazer parte do grupo é tão importante quanto ter habilidades técnicas. "Nos Estados Unidos, ninguém estranha se um funcionário é sério, solitário ou fechado. O importante é ele ser competente. Aqui, é fundamental se relacionar", explica.
Andrew, porém, considera essa característica uma vantagem. "O dia a dia fica melhor, mais leve. As pessoas geralmente são bem humoradas e menos rígidas, o que torna o ambiente agradável", diz. Em um primeiro momento, no entanto, isso pode ser entendido pelo estrangeiro como falta de seriedade, explica Vivian Leite, diretora da Goingplaces, consultoria que prepara pessoas para trabalhar em outros países.
De acordo com ela, o ambiente de trabalho mais descontraído e amigável é uma das coisas que mais fazem falta para quem vem trabalhar no Brasil e depois volta para casa. "Eles descobrem que é possível ser profissional sem ter de parecer sério e formal o tempo todo. E não conseguirão mudar isso em seus países de origem", diz. Ao mesmo tempo, Andrew acha que o estilo mais personalizado de liderar e de negociar acaba fazendo com que a hierarquia seja mais temida, o que na opinião dele é um ponto negativo. "As pessoas têm medo de confrontar os seus superiores e até mesmo de denunciar alguma injustiça. Nos EUA isso não acontece, pois se confia plenamente que o sistema protegerá o indivíduo. Aqui, protege-se o sistema."
Mariana Barros, diretora da Differance, empresa que oferece assistência para profissionais expatriados, afirma que a partir do momento que o estrangeiro entende as raízes de determinados comportamentos e atitudes, os preconceitos são quebrados. "O objetivo é fazê-lo entender não apenas como as coisas funcionam, mas os motivos disso. Quando a pessoa tem esse olhar abrangente, é como se caísse a ficha e tudo começa a fluir mais facilmente."
Joris Steinberg diz que mesmo comportamentos que considerava ineficientes mostraram ter suas vantagens. Logo, não é uma questão de quem é melhor ou pior, mas de saber trabalhar com as diferenças. "Os brasileiros têm o costume de deixar as coisas para a última hora. O planejamento fica sempre em aberto e se trabalha muito com a incerteza. A partir daí, porém, surgem a criatividade e a flexibilidade para resolver imprevistos, além de uma tolerância maior com os prazos", afirma o holandês, acostumado com modelos de trabalho mais rígidos e engessados.
Para Mariana Barros, as empresas multinacionais já se deram conta de que a cultura é importante para o bom desempenho do executivo e não deve ser desprezada. Deve-se, portanto, estudar a cultura de onde se vai entrar antes para evitar prejuízos depois. "Não adianta estereotipar. É preciso aprender a negociar os conflitos e incorporar as diferenças", diz. Na opinião de Vivian Leite os estrangeiros precisam entender que, pelo menos no curto prazo, são eles que devem se adequar ao ritmo dos colegas e não o contrário. "Se ele chegar tentando impor suas condições na força, sem respeitar as características locais e nem ouvir a equipe, será boicotado", ressalta.
Para quem viaja sozinho em busca de trabalho em outros países, sem o apoio de uma empresa ou de uma consultoria especializada, a dica de Mariana é buscar informações e networking em redes sociais específicas para expatriados como a InterNations (www.internations.org).
De maneira geral, contudo, os estrangeiros concordam que quem tiver disposição, vontade e mente aberta poderá aproveitar o tempo que viver no Brasil tanto pelo lado profissional quanto pessoal. A hospitalidade e a receptividade dos brasileiros, aliás, são fatores frequentemente elogiados por quem vem de fora. Segundo Steinberg, parte disso se deve também pelo fato de não haver uma barreira física. "Qualquer pessoa do mundo poderia ser brasileira. Não há um biótipo padrão aqui, então a integração fica mais fácil. Em determinados países o estrangeiro destoa da população local, sente-se um completo estranho e passa a ser tratado de forma diferente por conta disso."
Quem tiver mais interesse no tema, procure o livro de Keith Rosen chamado O jeito na cultura brasileira, da Editora Renovar.
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